os anos escorreram por entre meus
dedos calejados e o riso largo plantou
bananeira em meu semblante
os olhos gigantes curiosos encerraram o
expediente um par de horas antes pois
amanhã é feriado e as pernas estão cansadas
demais para o próximo passo que não
sei qual é nem qual rumo toma o que ascende
uma tocha debaixo da colmeia de vespas que habita
as entranhas de quem vos fala num dia de inverno
em que por razão desconhecida decidiu rever
fotografias da época dos dentes cor de
leite que não mais carregam significado na
memória
domingo, 10 de setembro de 2017
ÉROTIQUE
Aqueles que abrem as portas mais
fechadas pela moral e pelos bons
costumes expressam as mais
belas e sinceras formas de
arte (antes de morrerem de
alcoolismo
sífilis
ou se submeterem às leis
divinas).
fechadas pela moral e pelos bons
costumes expressam as mais
belas e sinceras formas de
arte (antes de morrerem de
alcoolismo
sífilis
ou se submeterem às leis
divinas).
PASSAGEIRO
O ato de fazer e desfazer
as malas nunca
é de fácil execução.
Entregamo-nos de bandeja à
obrigação de rever os
altos das prateleiras:
os convites de formatura
as cartas de amor
as fotos de um outro
tempo – fosse ele de alegria ou
tristeza.
O olhar para o passado é tão
apavorante o quanto a incerteza do
futuro.
Sinto o passado como uma
neblina que toca minha
face suavamente e embaça
meus olhos como as
lágrimas que um dia
chorei ao
partir e as outras tantas que
chorei enquanto permanecia.
...
Com outro suspiro cuja
duração não pude
conscientemente acompanhar
encerro a lírica
me desfaço de algumas roupas velhas
e, mais uma vez, guardo
os convites, as cartas, as fotos
nas mais altas prateleiras.
as malas nunca
é de fácil execução.
Entregamo-nos de bandeja à
obrigação de rever os
altos das prateleiras:
os convites de formatura
as cartas de amor
as fotos de um outro
tempo – fosse ele de alegria ou
tristeza.
O olhar para o passado é tão
apavorante o quanto a incerteza do
futuro.
Sinto o passado como uma
neblina que toca minha
face suavamente e embaça
meus olhos como as
lágrimas que um dia
chorei ao
partir e as outras tantas que
chorei enquanto permanecia.
...
Com outro suspiro cuja
duração não pude
conscientemente acompanhar
encerro a lírica
me desfaço de algumas roupas velhas
e, mais uma vez, guardo
os convites, as cartas, as fotos
nas mais altas prateleiras.
DESPEDIDA
A saudade prematura transborda
dentro de mim enquanto a
gratidão de um passado
recente acalenta o frio de um
inverno que acabou
de começar: me perco em
meio a uma NUVEM DE LÁGRIMAS.
Se a partida dói e parece cruel,
é seguro afirmar que a estadia
foi uma aventura fantástica
e preferível acreditar que
é hora do fim.
Da cidade
levo a lembrança gelada
das ruas e avenidas
e das trilhas em meio a um Jardim
Botânico.
Dos amigos
carrego com carinho suas
peculiaridades, bordões
e os bons momentos vividos
intensamente
nessa cidade russo-brasileira
chamada Curitiba.
dentro de mim enquanto a
gratidão de um passado
recente acalenta o frio de um
inverno que acabou
de começar: me perco em
meio a uma NUVEM DE LÁGRIMAS.
Se a partida dói e parece cruel,
é seguro afirmar que a estadia
foi uma aventura fantástica
e preferível acreditar que
é hora do fim.
Da cidade
levo a lembrança gelada
das ruas e avenidas
e das trilhas em meio a um Jardim
Botânico.
Dos amigos
carrego com carinho suas
peculiaridades, bordões
e os bons momentos vividos
intensamente
nessa cidade russo-brasileira
chamada Curitiba.
quinta-feira, 15 de junho de 2017
VINIL QUEBRADO
PARTE I
a adrenalina
entranhada
no
desconhecido
a
excitação
do
primeiro
toque
o
descobrir
da pele
o êxtase
da
língua
molhada
a porta
abriu
o
telefone tocou
o beijo
acabou: afogado em culpa
PARTE II
O
espírito carnavalesco
em descompasso
com o calendário:
as datas
comemorativas
dificilmente
acompanham
os
sentidos do corpo
humano.
Descidas
de ladeira
pilares
de viadutos
ressaca
dos olhares
uma cama
de solteiro
desarrumada.
Bêbados
arruaceiros
dançam ao
som vermelho
de
Caetano Veloso...
Enquanto
o cotidiano
carregou
nas costas
o riso
de um bêbado,
a folia
dos carnavais
levou
consigo
as
migalhas
do outro
pobre
embriagado.
PARTE
III
a poesia
frouxa
encontrou
certezas
alheias
e
dissimulou
concordar
pois
queria os
adjetivos
difíceis
riscando
suas
folhas
de papel
em
branco
um
oceano de cabelos
escuros
como o universo
deve ser
durante a
noite
invadiu meu
quarto
quando eu estava
com frio
e chovia lá fora
citando
Drummond e outros
autores
que eu não gostava
naqueles
dias recitou meia
dúzia de
poesias e uma dúzia de
problemas
vislumbrou minha
figura e
eu questionei meu
reflexo
entregou
páginas
amareladas envoltas por couro
preto ao
espírito torto do
poeta
boêmio e depois cruzou
o oceano
de águas azuis
PARTE IV
no topo
de uma pilha de
sujeira
e arrependimentos
eu te
via bater as asas em
círculos
mas você decidiu fazer uma
faxina
quinta-feira, 4 de maio de 2017
VERÃO
O verão acabou.
As margaridas,
outrora coloridas,
floresciam por entre
as rochas dos jardins.
Os pássaros
cantavam hinos - “ia ia ô”,
as borboletas
sobrevoavam nossas
cabeças
e, juntos, tirávamos
os pés do chão.
Perto
ou longe
eu ouvia sua
risada e partilhava
sua alegria;
seu colo foi
meu consolo
ao fim da
primavera.
Foi num domingo
nebuloso
que o verão se encerrou.
A notícia voou
e refez
os passos e caminhos
tomados por você
em dias ensolarados de verão.
Hoje as nuvens choram
os pássaros não cantam
as borboletas dormem
nossos pés se grudam ao
chão como raízes profundas
de uma árvore centenária:
saudosa e amargurada.
É dia de colher
as margaridas.
Outono:
as folhas
secas se abraçam,
todas no chão,
e resistem
ao vento
frio que
sopra.
Em Belo Horizonte,
Cuiabá
e outras cidades
- que não couberam
na poesia,
foi anunciado
um rigoroso
inverno.
Se este verão
chega ao fim
com a ausência
do seu
toque,
o poeta,
desolado,
encerra
a poesia com
a nota:
seu riso gostoso,
seu coração gigante,
sua presença quente
estarão sempre
presentes
onde seus passos,
um dia,
estiveram.
sábado, 18 de março de 2017
LÍNGUA PORTUGUESA
minha palavra favorita
é AVÓS
veja bem! só depois de velhas
nos tornamos
o "gênero predominante"
é AVÓS
veja bem! só depois de velhas
nos tornamos
o "gênero predominante"
FUNERAL
Em dia de funeral
burro vira cavalo.
A enxada ferruginosa
cava do solo vermelho
árido
figuras santas
milagres semi-presenciados
- a paróquia se levanta
ergue os braços
magros de verdades
louvando
em devoção.
O corpo
estirado
em paz carnal
os olhos
fechados
de segredos
os bolsos
vazios
de reais
- fartos de canhotos.
O padre
emotivo
lamenta tamanha perda
enquanto o coveiro
indiferente
cobre o belo caixão de terra
e o povo espera
ansioso
a ferramenta idosa
que a imagem de mais um burro enterra.
burro vira cavalo.
A enxada ferruginosa
cava do solo vermelho
árido
figuras santas
milagres semi-presenciados
- a paróquia se levanta
ergue os braços
magros de verdades
louvando
em devoção.
O corpo
estirado
em paz carnal
os olhos
fechados
de segredos
os bolsos
vazios
de reais
- fartos de canhotos.
O padre
emotivo
lamenta tamanha perda
enquanto o coveiro
indiferente
cobre o belo caixão de terra
e o povo espera
ansioso
a ferramenta idosa
que a imagem de mais um burro enterra.
SOBRE PÉS E ABÓBORAS
Sempre andei depressa.
Aprendi a andar aos 10 meses
no meu aniversário de 1 ano, corria
hoje não corro:
ando a passos largos e velozes.
Aprendi com meu pai.
Quando criança
me ensinou a comer abóbora
"pra engrossar as pernas"
o que, na época, achei absurdo
e, sem razão plausível,
vetei o pobre vegetal da minha dieta.
Meu pai me ensinou o olhar fixo
as trajetórias bem definidas
usar o cinto de segurança.
Era ele quem me estendia a mão
quando criança
e caminhava veloz ao meu lado
(nunca entendi a razão
de andar devagar
por estar acompanhada de crianças).
Aprendi a andar aos 10 meses
no meu aniversário de 1 ano, corria
hoje não corro:
ando a passos largos e velozes.
Aprendi com meu pai.
Quando criança
me ensinou a comer abóbora
"pra engrossar as pernas"
o que, na época, achei absurdo
e, sem razão plausível,
vetei o pobre vegetal da minha dieta.
Meu pai me ensinou o olhar fixo
as trajetórias bem definidas
usar o cinto de segurança.
Era ele quem me estendia a mão
quando criança
e caminhava veloz ao meu lado
(nunca entendi a razão
de andar devagar
por estar acompanhada de crianças).
Meu pai anda depressa
e assim me ensinou.
Mas foi minha mãe
quem me ensinou a olhar para os lados
e admirar a paisagem.
e assim me ensinou.
Mas foi minha mãe
quem me ensinou a olhar para os lados
e admirar a paisagem.
sexta-feira, 17 de março de 2017
WALK ON THE WILD SIDE
Minha poesia é catarse.
Traqueostomia.
Dentro de mim vive uma criatura monstruosa
e sussurra ao pé do meu ouvido
as ideias mais assustadoras.
Mecanicamente,
a mão traduz
o que a boca,
por orgulho,
se recusa dizer.
Mecanicamente,
a mão traduz
o que a boca,
por orgulho,
se recusa dizer.
MELANCOLIA
a batalha diária
da pílula
rosada
versus garganta
seca
da lágrima
e da retina
do berro
e das cordas
vocais
o mundo
externo perfura
a alma como uma
adaga
derrama seu
veneno
na corrente sanguínea
e a boca
alheia
estanca o
sangramento
intoxicado
o mundo
interno arranha
as paredes da caixa
torácica
procura no escuro
por si mesmo
e não
se encontra
posto que já
não se
reconhece
sábado, 11 de fevereiro de 2017
YOGA
Ela acorda, religiosamente, às 7:00. Certa vez a bateria do
celular acabou durante a noite e, mesmo sem o alarme do despertador, ela acordou
às 7:00. Em ponto. Creio que não pelo hábito, mas sim por uma compulsão pela
rotina estabelecida há treze anos e meio atrás, às margens dos seus vinte e
tantos anos de idade. Ela entra no banheiro e deixa a porta entreaberta. Liga o
chuveiro e espera a água esquentar: ela sabe que a observo. Se veste e toma o
café preto, forte, sem açucar. Então sai para o trabalho e, às 12:30, recebo
notícias suas. Me manda uma mensagem perguntando qualquer coisa: que horas
chego em casa? Se faço a janta ou se ela deve fazer? Respondo de prontidão e
logo retomamos os afazeres. Chego em casa por volta das 18:00. Não é anormal
que ela chegue depois de mim: ela passa por avenidas onde o tráfego é denso, ao
passo que eu trabalho num bairro próximo. Ela chega, jantamos e nos arrumamos
para deitar. Vez ou outra transamos.
O que os vizinhos, os amigos, os familiares não sabem é que
nas segundas e quartas, depois do trabalho, ela vai à yoga. Ela diz que vai à
yoga. Mas EU sei que ela não vai à yoga. No próximo mês completam dois anos que
ela começou a frequentar as aulas de yoga e meditação. Dois anos que ela o
encaixou em sua rotina. Eu não o conheço. Ele trabalha com ela. Também é
casado. Ele tem uma filha. 3 anos. Já o vi, à distância. Bem apessoado. Por
raro descuido dela, conheço seu cheiro.
Diferente dela, eu
não tenho rotina definida. Não acordo às 7:00 em ponto, não bebo café sem
açucar, não vou à yoga. Às quintas, depois do expediente, eu vou ao bar com os
colegas de trabalho. Nem sempre vou ao bar com os colegas. No entanto, é o que
digo a ela. Uma vez por mês eu vou ao bar sozinho. E saio acompanhado. Eu
sempre volto pra ela. Ela não cheira meu paletó. Ela também não me cheira às
quintas de noite. Diz que é em razão do
cheiro de bebida. Mas eu sei que não é. Ela também sabe.
Anos atrás, quando ela não frequentava a yoga às segundas e
quartas e eu o bar às quintas, ela não deixava a porta do banheiro entreaberta.
Ela não mandava a mensagem às 12:30. Nós nunca transávamos. Eu não lembrava
qual era o cheiro dela.
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